A narrativa de "O Tradutor de Estrelas" desenvolve-se numa prosa densa,adotando a perspectiva memorialística de um narrador próximo ao protagonista — ora assumindo o papel de biógrafo, ora o de observador envolvido. A narrativa explora temas como o isolamento, a alteridade, o poder da linguagem e a tênue linha que separa a genialidade da monstruosidade. O distanciamento emocional, presente desde as primeiras linhas — "O alheamento é uma das formas de sobreviver" — permeia toda a trajetória de Próspero, sugerindo um perfil destinado a observar e decifrar o mundo mais do que participar dele. O autismo, diagnosticado ainda na infância, funciona como ponto de partida para sua habilidade linguística extraordinária, mas também para a alienação emocional, a sensação de inadequação e a subsequente frieza em suas ações. A obsessão pelos livros, pela leitura sistemática e pelo domínio de línguas — incluindo aquelas mortas ou em extinção — reforça a associação entre conhecimento, poder e isolamento. Outro eixo temático envolve a violência oriunda da incompreensão social e do bullying sofrido no ambiente escolar, que atua como catalisador da transformação de Próspero em psicopata. O enredo detalha o surgimento e a propagação do ódio como motor dos crimes, conduzindo a reflexões sobre as consequências extremas da exclusão, do preconceito e da incapacidade social de acolher o diferente. Quando manifesta, a violência adquire aspecto quase ritualístico, frequentemente justificada pelo protagonista como punição contra tradutores e compradores de enciclopédias, considerados por ele como ameaças ao conhecimento autêntico e à integridade literária. A progressão dessa ira, do ato justificável (vingança contra agressores) ao arbitrário (assassinatos aleatórios), denuncia a ruína definitiva de sua humanidade. Merece destaque a reflexão metalinguística: o ofício do tradutor é questionado em seus aspectos técnicos e existenciais, e a tensão entre original e tradução ganha importância simbólica nos atos extremos de Próspero. A sequência em que o protagonista traduz estrelas representa um dos momentos de maior densidade especulativa, condensando o desafio de comunicar o que, por natureza, resiste à linguagem. "O Tradutor de Estrelas" desenvolve uma narrativa multifacetada em que genialidade, isolamento e violência se entrelaçam para questionar fronteiras essenciais: as do humano, da linguagem, da sanidade e da justiça. A obra se debruça sobre o limite entre o incompreensível e o traduzível, tanto na esfera linguística quanto na existencial.